19 março 2011

"Ti-ti-ti" deve ocupar lugar privilegiado na história da teledramaturgia

Trama pode ser considerada uma das melhores paródias do gênero folhetim

Revendo uma das cenas


Quem diria que um remake poderia causar tanto rebuliço quanto Ti-ti-ti? Nas mãos de Maria Adelaide Amaral, a história original de Cassiano Gabus Mendes ganhou proporções inimagináveis, tanto no desenvolvimento do enredo, devidamente atualizado e com novas histórias paralelas, quanto no sucesso de público — em alguns dias, chegou a alcançar audiência maior que a novela das nove, Insensato coração. E, mais do que isso, "Ti-ti-ti" tem tudo para ocupar lugar privilegiado na história da teledramaturgia. A esta altura — o último capítulo da novela ainda será exibido amanhã —, isso pode parecer exagero. Mas, no futuro, a "Ti-ti-ti" de Maria Adelaide será certamente lembrada, pelo menos, como uma das melhores paródias já feitas ao próprio gênero.

A certa altura, Jaqueline (Claudia Raia) perde a paciência com Thales (Armando Babaioff), que vive um dilema em relação à própria sexualidade. “Enquanto você fica trancado em seu closet, tem gente vivendo uma vida de verdade aqui fora”, diz ela. “Mas o que é que eu faço?”, ele pergunta desesperado. E Jaqueline: “Ora, faz como Laurinha Figueiroa, se joga!”. Quem assistiu a Rainha da sucata (1990) sabe que ela está falando da vilã interpretada por Glória Menezes, que no último capítulo se jogava do alto de um edifício. "Ti-ti-ti" abusou de citações como essa. A mesma Jaqueline xingou várias vezes Suzana (Malu Mader) de “sua fera radical”, referindo-se a "Fera radical", novela estrelada por Malu em 1988.

Em muitos momentos, a metalinguagem surgia como um deboche à própria trama. Ariclenes (Murilo Benício) diz: “Prefiro terminar essa novela na sarjeta a fazer acordo com essa cacatua”. Em outra cena, um personagem exclama: “Mas isso parece romance de novela das sete!”. Os atores pareciam se divertir em cena e a brincadeira sobrava para o telespectador, que respondia com gargalhadas do sofá. E foi assim, entre gargalhadas e muito bom humor, que Maria Adelaide e seu time de colaboradores conseguiram algumas inovações que também contribuirão e muito para colocar "Ti-ti-ti" em evidência quando pensarmos futuramente na evolução do gênero novela.

Boletim de Ocorrência: banda da Jaque

Uma delas foi o tratamento dado à questão da homossexualidade, que deixou a ver navios os que ainda se angustiam com a liberação ou não do “beijo gay” na tevê. Os autores foram mais longe e mostraram as relações amorosas entre pessoas do mesmo sexo com uma naturalidade jamais vista nas telenovelas. Até mesmo os conflitos de Thales em sair do armário eram pontuados com humor — como se percebe no diálogo entre ele e Jaqueline citado acima. Mais do que beijo, sentimentos foram expostos com notável sinceridade por todos os atores envolvidos. Os diálogos entre Julinho (André Arteche) e a resistente Bruna (Giulia Gam), na primeira fase da trama, fizeram mais pela visibilidade gay do que uma dúzia de beijos que pudessem ser exibidos.

Outro aspecto em que "Ti-ti-ti" se mostrou moderninha foi na dessacralização do ato sexual como algo a ser guardado para o ser amado. Todo mundo torcia para que Marcela (Ísis Valverde) voltasse para Edgar (Caio Castro), o que não a impediu de, na tentativa de dissipar sua dúvida entre Edgar e Renato (Guilherme Winter), ir para a cama com o segundo. Em uma novela, digamos, mais quadrada, a heroína teria resistido bravamente à tentação e, vencidos os percalços, voltado “pura” para o amado. O mesmo se deu entre Jorgito (Rafael Cardoso) e Desirée (Mayana Neiva), já que o rapaz acabou se entregando aos encantos da dissimulada Stéphany (Sophie Charlotte). Duvido que algum telespectador mais conservador preferisse que isso não acontecesse, em ambos os casos.

Fonte: Correioweb

Categories: ,

0 comentários:

Postar um comentário